Uma pedagogia para a Iniciação Cristã – II

Na dimensão teológica destaca-se que a catequese é um acto de Revelação, de tradição viva, pelo que é inseparável a ortodoxia e a ortopraxis. A catequese tem de ser sempre uma iniciação ordenada e sistemática à revelação que Deus faz de si mesmo à humanidade(cf CT 22). Esta revelação encontra-se na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição(cf DV 8). A catequese, como um acto de transmissão da Revelação, deve acomodar-se ao modelo divino de se revelar, que o faz por obras e palavras intimamente unidas(cf DV 2), e tem o seu ponto culminante em Jesus Cristo. A Jesus Cristo, o homem de todos os tempos, pode aceder-se pela fé transmitida na Igreja, sob a acção do Espírito Santo, tal como a comunidade a recebeu, compreende, celebra, vive e a comunica (cf DGC 105).
De facto, o objectivo da catequese é proporcionar ao catequizando as condições necessárias para, sob a acção do Espírito Santo, chegar à a profissão de fé(cf DGC 66), íntegra e total. Para que isso seja possível, a catequese deve transmitir os sete elementos básicos: as três etapas da história da salvação (dimensão narrativa) e os quatro pilares da fé (dimensão expositiva). Aqui vemos a importância da Sagrada Escritura e do Catecismo da Igreja Católica. A catequese não é outra coisa que a transmissão vital e significativa dos documentos da fé( cf MPD 9), pelo que se pode agrupar em quatro, as linguagens de fé: doutrinal, litúrgica, orante e testemunhal.
Na transmissão da fé, a linguagem é algo imprescindível, a que devemos prestar atenção(cf DGC 208; CT 59). Jesus Cristo não se identifica em exclusiva com nenhuma cultura ou sistema de pensamento, mas revelou-se numa linguagem concreta. Foi certamente uma linguagem original e também normativa para qualquer outra linguagem que pretenda ser veículo da transmissão da Revelação.

Uma pedagogia para a Iniciação Cristã – I

Quando se fala em pedagogia, estamo-nos a referir ao modo de conduzir, organizar e tentar alcançar uns objectivos educativos, pelo que o conceito de pedagogia é mais amplo do que o de didáctica ou de metodologia.
Esta pedagogia é moldada pelo conceito de catequese ao serviço da iniciação cristã, com uns determinados conteúdos e um itinerário.
Para alcançar estes objectivos a pedagogia catequética precisa de instrumentos didácticos, lugares e pessoas que realizem a catequese.
Ao longo dos próximos tempos iremos propor uma determinada pedagogia, dividida em quatro dimensões ou coordenadas: a teológica, a catequética, a espiritual e a psico-pedagógica.
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Algumas Opções de Fundo!

Nos tempos que correm, considero que a Catequese terá que fazer algumas opções de fundo:
– A primeira opção é uma Catequese ao serviço da Iniciação Cristã. A catequese específica que se há-de realizar é a de uma autêntica iniciação ordenada e sistemática à revelação divina que Deus transmite à humanidade, em Jesus Cristo, conservada na Igreja e nas Sagradas Escrituras. Esta revelação é anunciada de geração em geração através de uma tradição viva, da qual a catequese é parte integrante(cf DGC 66). A catequese de iniciação, dentro do processo evangelizador, é o momento em que se estrutura a conversão a Jesus Cristo, num esforço de fundamentação da primeira adesão(cf DGC 63).
O Directório Geral da Catequese, no número 66, diz expressamente: «a catequese é, assim, elemento fundamental da iniciação cristã e está estreitamente ligada com os sacramentos de iniciação, de modo particular com o Baptismo, “sacramento da fé”. O elo que une a catequese ao Baptismo é a profissão de fé, que é, ao mesmo tempo, o elemento interior deste sacramento e o objectivo da catequese. A finalidade da acção catequética consiste precisamente nisto: favorecer uma profissão de fé viva, explícita e actuante. Para alcançar esta finalidade, a Igreja transmite aos catecúmenos e aos catequizandos a sua fé e a sua experiência do Evangelho, a fim de que estes assumam como sua e, por sua vez, a professem»(DGC 66). Por isso, a catequese autêntica é sempre iniciação cristã.

– A segunda opção será pela significatividade da mensagem. Julgo estar ultrapassado o tempo em que para se ser bom cristão bastava dominar intelectualmente os conhecimentos doutrinais. Faz falta algo mais. A mensagem cristã deve poder ser vista por cada crente como uma abertura para a sua vida, uma resposta às suas dúvidas e anseios, uma fonte de valores e de plenitude de vida. Em síntese: a mensagem deve ajudar a descobrir o sentido e o significado da vida. A mensagem cristã deve tocar o saber, mas também o sentir e o querer.

– Um dos flagelos do cristianismo actual é a separação entre a fé e a vida: uma fé que não gera cultura. É certo que o DGC pede que ao cristianismo que se seja capaz de se inculturar nas diversas culturas, potenciando-as e iluminando-as. No nosso contexto, ganham especial destaque os fenómenos da pluralidade cultural, a modernidade e a pós-modernidade (com tudo que isso acarreta), o destaque da cultura mediática, a globalização de fenómenos culturais. Aqui a catequese vê a sua missão redobrada, pois tem de ser capaz de estar, dizer-se e propor-se.

– A catequese é, essencialmente, um processo comunicativo, e a comunicação é vista como uma das realidades mais determinantes e mais estudadas na actualidade, às quais a catequese evangelizadora não se deve alhear: deve repensar a sua identidade e a sua missão neste contexto e à luz das novas exigências. No âmbito catequético destaca-se sobretudo a necessidade de respeitar as regras e a ética da comunicação. No centro desta problemática encontra-se o tema da linguagem e das linguagens da catequese, um problema que toca a medula da comunicação catequética e que está muito longe de ter sido ainda resolvido. Ainda não são frequentes bons exemplos da utilização da linguagem da fé nos nossos ambientes eclesiais.
Por outra parte, experimenta-se também com força a necessidade de promover uma pluralidade de linguagens, superando assim a tradicional unilateralidade da linguagem expositiva magistral e valorizando mais o emprego das linguagens não verbais: a imagem, o som, o símbolo, a expressão corporal, os espaços, e muitas outras.

– Por último, a comunidade cristã, nas suas diversas modalidades, apresenta-se hoje como o lugar por excelência da catequese, enquanto permite uma autêntica experiência de vivência cristã e de aprofundamento na fé (DGC 158, 254). A catequese é, pois, uma actividade de todos os cristãos. Por isso, a catequese não se deve reduzir, ou ser reduzida, a uma actividade individual de uns quantos ou de alguém em particular: a comunidade é o lugar, meta e âmbito da catequese. Esta consciência abre a possibilidade de novos lugares ou vias para realizar a missão catequética.
Talvez seja altura das pequenas comunidades, dentro da Comunidade, assumirem todo o seu valor e potencial e serem, elas próprias, os grandes lugares catequéticos.
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(c) 2005 – Luís Zilhão

Uma conversão pastoral

Depois de ler Emilio Alberich, faço eco de uma sugestão: a conversão pastoral.
Diz ele que hoje sente-se a urgência de uma mudança radical em vista de uma nova orientação pastoral na acção dos fiéis cristãos. Estamos diante de uma praxis pastoral tradicional, centralizada preferencialmente sobre a sacramentalização e na prática religiosa, que não tem futuro, que não é capaz de assumir uma autêntica opção evangelizadora, nem de responder aos desafios da nova cultura.
A tão proclamada nova evangelização projecta todo o trabalho pastoral numa perspectiva missionária, para a qual não estamos preparados.
Bem lá no fundo do problema encontra-se a necessidade de um diálogo sincero entre fé e cultura, na atitude de sincera e simpática compreensão para com o mundo de hoje, sem, por outra parte, renunciar ao necessário dever do discernimento evangélico. Sobretudo, requer-se o abandono, sem saudosismos, de toda a visão eclesiocêntrica e de todo desejo de reconquista de posições perdidas. Nesta perspectiva, devem ser superadas as frequentes tentações de cair na rigidez fundamentalista ou no fechamento elitista ou sectário.

… e não é que Alberich tem razão!

Mudam-se os tempos…

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o Mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões

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  • Estará a catequese de hoje, nomeadamente nos seus actores da ribalta, à altura de perceber a mudança que se deu no modo de mudar?
  • Quais os caminhos a trilhar para se realizar uma catequese fiel ao Mestre e ao discípulo?

O Catequista

A década de 90 viu nascer dois instrumentos valiosos no âmbito catequético: o Catecismo da Igreja Católica(1992) e o Directório Geral da Catequese(1997). Nestes, podemos encontrar o resultado de toda a riqueza que o Concílio Ecuménico Vaticano II fez emergir na Igreja.
Mesmo a forma como o Catecismo foi acolhido mostra como, na Igreja, há tensões que nada ajudam à transmissão da fé. Há até a veleidade de, pela forma como se olha o Catecismo, pretender catalogar a que grupo de cristãos se pertence. É pena! Ou não somos todos de Cristo?!?
O Directório, por sua vez, ao consagrar uma catequese de estilo catecumenal, e ao pôr no devido destaque a Iniciação Cristã, coloca a descoberto um grande problema: faltam comunidades capazes de acolher, acompanhar e iniciar na fé.
Mas eu vejo o futuro com esperança. Sei onde pode estar a solução: nos catequistas, expressão da preocupação missionária de uma comunidade que, podendo não o ser, se quer capaz de iniciar na fé aqueles que mostram interesse em fazer um caminho de incorporação no Corpo Místico de Cristo.
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O Catequista é «chamado a ensinar Cristo deve, portanto, antes de mais nada, procurar esse lucro sobreeminente que é o conhecimento de Jesus Cristo. Tem de aceitar perder tudo (…) para ganhar a Cristo e encontrar-se nEle e conhecê-Lo, a Ele, na força da sua ressurreição e na comunhão com os sofrimentos, conformar-se com Ele na morte, na esperança de chegar a ressuscitar dos mortos»(CCE 428).
É deste despojamento que há-de surgir a Catequese.

Algumas sombras

No nosso ambiente da catequese podemos encontrar, juntamente com muitos sucessos e experiências gratificantes, um certo mal-estar que se evidencia nos seguintes fenómenos:
– A catequese, que devia ser de iniciação cristã, não inicia. A conclusão da celebração dos sacramentos de iniciação cristã é vista, por muitos adolescentes e jovens, como o fim da vida cristã. O processo de iniciação converteu-se em «conclusão» da vida cristã!;
– A catequese, apesar de se realizar também com jovens e adultos (e há várias experiências dessas) ainda é vista como uma coisa de crianças, infantil e infantilizante;
– A catequese também é vista como escola, com a mera preocupação da transmissão de conteúdos cognitivos, ignorando a totalidade da pessoa. A catequese não «toca» os corações, não é significativa.
– A catequese, que deve de ser missionária, vive quase exclusivamente daqueles que se «inscrevem», é incapaz de se propor em âmbitos a-cristãos.