Um texto lindo…

[Agradeço o comentário de Absurdo, que aprecio muito. Coloco-o aqui na totalidade]

Através do blogue Eidw fiquei a conhecer o A Catequese em Discussão. É por isso que queria deixar, por aqui, algumas considerações relativas à catequese católica, baseadas na minha própria vivência.Tive catequese do primeiro ao quarto ano, quando fiz a minha primeira comunhão. No ano seguinte, não me quis voltar a inscrever: a catequista mudava, e receava não ter tempo, com o ingresso no segundo ciclo; além disso, é verdade, não via a catequese como algo de muito apelativo para mim, nem sequer como algo importante. Por essa altura era raro ir à missa; fui, por uns tempos, após a primeira comunhão, mas logo deixei de ir.Foi só aos treze anos que senti como que uma chamada, e comecei a dedicar-me com maior fé às coisas da religião – até então, vivia num estado de profundo desligamento. Foi nessa altura que comecei a ler a Bíblia, que encarava, primeiramente, como fonte de cultura. Ora, o tempo foi-se passando, e o meu interesse e a minha fé crescendo. Então, um ano depois, decidi que haveria de retomar a minha formação católica (no entanto, inercialmente, nada de missas: sentia-me retraído para dizer a minha mãe onde ia). Mas firme ficou a decisão de me inscrever na catequese no ano seguinte – ou seja, no décimo ano. O objectivo era um: receber o Crisma. Sentia que isso seria a melhor maneira de me passar a responsabilizar pela minha fé, sendo também, o culminar do processo. Ora, nem mesmo nesse ano de catequese ia à missa. Só por vésperas do Crisma me confessei pela primeira vez em muito tempo, dando-me o Bispo o Crisma, e a Eucaristia, no Domingo seguinte. Desde então, sim, posso considerar a minha vida religiosa normalizada.Vem este registo autobiográfico para contextualizar as minhas impressões sobre a catequese. São-no sobre esse ano que lá andei (por sinal, o ano passado), já que, dos outros, a memória é parca. De qualquer forma, se na altura saí, foi porque não estava agradado.O facto é que guardo desse ano, e dessa catequese, não boas recordações: era um dos três rapazes, e num grupo com que nada simpatizava. A catequista, bastante jovem, até, não era propriamente uma mestre em Teologia Moral. Tinha muito jeito, é certo, para cantar Salmos, mas não sei: não a vejo como catequista. E como era, exactamente, aquela catequese? Era de várias formas. A maior parte das vezes, falava-se. Falava-se muito do amor, do amor, do amor. Cristo também falava – mas, no Evangelho, fá-lo sempre duma forma exacta, brilhante. Que é preciso amar, porque Jesus nos amou, sabíamos já todos, porque no-lo era repetido até à exaustão. E eu sei que é o único dever do cristão – amar: a Deus sobre todas as coisas, ao próximo, como a si mesmo. Mas depois disso vinha um chorrilho de banalidades, que tinham o condão de impacientar e desagradar quem por lá estava. – E o que é para ti o amor? E queres partilhá-lo? Caramba, o amor é aquilo que é para mim… E depois liam-se poemas, e textinhos bonitos – às vezes, tão lamechas quanto aquelas mensagens de correio electrónico brasileiras. Para quê, pergunto eu?É que o que mais me espantou foi o facto de a Bíblia estar por lá arrumada num canto. Talvez porque já a tinha lido, sentia uma falta imensa em não nos ser mostrado onde é que estava o que nos diziam. Nem mesmo a passagem do mandamento novo, o do amor. Não digo que isto tornasse a catequese mais aliciante para alguns que, quase contrariados, lá andavam. Mas pelo menos, os que andavam por gosto, ficavam a saber algo em termos. Digo, então, que aquelas catequeses pareciam as homilias que pouca ligação têm com as leituras – com a diferença de, na catequese, não haver leituras. Aliás, notei, também, que havia uma enorme distanciamento entre a catequese e a missa: parecia que nada tinham de ralacionado.E aquelas apresentações de diapositivos com uma música de fundo insuportável? E com crianças sorridentes a brincar num jardim, ou pássaros, ou exemplos de pôr-do-sol, que serviam de base a poemas monótonos e repetitivos? Davam sono…É, talvez, por isso, que há uma gradação decrescente no número de jovens inscritos na catequese. Por esta ser como é, e por eles serem como são. Que, é verdade, muitos só la andavam por obrigação dos pais.Assumo que é muito fácil criticar sem propor sugestões: mas se eu sei apontar os erros porque estive lá, não se me afiguram grandes correcções porque não tenho formação. De qualquer forma, sempre me parece que a iniciativa de ir à catequese tem de partir dos próprios jovens. Que não podem ser aliciados com papelinhos que dizem que é fixe e divertido e que, porventura, não têm qualquer efeito. A catequese é o que é. E deve ser o que parecer melhor a quem sabe. Julgo, porém, que o actual modelo não é o mais adequado: os seus resultados estão à vista.Como deveria ser, então? Em primeiro lugar, não se limitando a pregar o amor e outras virtudes, mas mostrando também os seus efeitos, e consequências da não prática delas. Ligando-se mais à missa, funcionando como complemento desta e em articulação com esta – talvez, explicando-se na catequese aquilo que o padre explica na missa, mas da forma mais adequada à idade de cada um. Preparando os jovens para os Sacramentos, direccionando-os a eles como a um objectivo a atingir – e demonstrando, portanto, as responsabilidades inerentes a cada um. (Não sei porquê, mas apetece-me referir, aqui, que sou fervoroso apoiante do neo-catecumenato.)E, enfim, fazendo-se por ser, para os jovens, mais que um dever, um direito que estes têm, e, enquanto direito, algo opcional e responsabilizante: é só para quem quer; quem quer terá responsabilidades; essas responsabilidades são o que conduz à participação plena na vida da Igreja, com todos os frutos que isso traz.Talvez o tom do artigo tenha sido um pouco duro, irónico nalguns casos. Não nego que a catequese, mesmo a que se pratica hoje, tem alguns bons resultados. Mas nós, cristãos, temos o dever de agir para a melhorar. A bem de toda a Igreja.
Absurdo

Sábado, Junho 18 in Padre Zé

Ando de volta da Catequese de adultos, para o exame de Segunda. Entre muitas coisas interessantes que encontrei (é uma daquelas cadeiras importantes e interessantes, e que mais me tem dado que pensar?) deixo aqui uma, algo secundária, e mesmo muito duvidosa (que isto de classificar pessoas em estádios é tudo menos matemático, e quanto aos estádios em si também têm pouco de matemático?), mas que pode ajudar a pensar o nosso «estádio pessoal»?

A teoria é de Fritz Oser que, como método de investigação, usava os dilemas, nomeadamente o «dilema de Paul»:

Paul, um jovem médico com um futuro brilhante diante de si, parte para umas férias no fim dos estudos. Quando o avião tem uma avaria e começa a cair, Paul reza e faz a promessa de, a partir desse momento, pôr a sua vida ao serviço dos mais pobres em África, no caso de se salvar. Paul sobrevive, mas depois é-lhe oferecida uma situação profissional aliciante. Deve ou não aceitar? Deve partir para a África como tinha prometido? Paul fica na Europa, e alguns meses depois tem um acidente de automóvel. Trata-se de uma punição por não ter mantido a promessa? Entra aqui a vontade de Deus? Uma promessa deve ser sempre mantida? Recorda-se de situações semelhantes na sua vida? Como teria respondido às mesmas perguntas há alguns anos?

Da análise das respostas, Oser elabora uma proposta de leitura dos «estádios da fé» que Emílio Alberich resume assim:

Estádio 0: perspectiva da «dicotomia interno-externo» (até aos 2/3 anos) e Estádio 1: «deus-ex-machina» (entre 2/3-6/8 anos)
A criança pequena não tem ainda um «Último» (atitude pré-religiosa). Mais tarde sente-se dependente de um «Último» que intervém de forma pontual e imediata no mundo para punir ou ajudar os homens, como o deus-ex-machina das tragédias gregas. O Último é «sujeito absoluto»: o homem é objecto e executor.

Estádio 2: «do ut des» (entre 6/8-11/13 anos, às vezes até à idade adulta)
Neste momento, a criança pode não apenas reagir ao Último, mas agir sobre ele, com meios que permitem obter a sua benevolência e serviços ou fugir à sua punição. Neste estádio mantém-se com o Último uma relação de reciprocidade («dou para que dês»). O agir humano assume uma nova importância frente a este «sujeito (ainda sempre) absoluto».

Estádio 3: «deísmo» (depois dos 11/13 anos, às vezes até à idade adulta)
Algumas experiências negativas (desilusões) com o Último fazem muitas vezes o homem voltar-se para si mesmo: ele percebe que agiu e viveu «bem» e, no entanto, é vítima da desgraça. A ideia que é o próprio homem o responsável pela sua vida orienta o seu parecer, e nesta espécie de «teoria dos dois Reinos» procura estabelecer um equilíbrio entre «aquilo que é de Deus e aquilo que é do homem». A pessoa tem então a possibilidade de «delimitar o seu território»: o Último agora não intervém directamente no mundo (deísmo). Neste estádio nega-se, por vezes, a existência deste Último (agnosticismo ou ateísmo) em nome da autonomia.

Estádio 4: «a priori» e «correlação»Um novo passo é muitas vezes interpretado como uma regressão, pois dá-se de novo uma ligação com o Último. A responsabilidade e a liberdade (permanece-se livre) orientam sempre o parecer, mas com a experiência que qualquer coisa é confiada ao homem. O Último é considerado como o fundamento transcendente que cria «a priori» as condições das relações humanas, da liberdade e da sociabilidade. Admite-se muitas vezes a existência de um «plano», no sentido que o homem se envolve através de uma lei interna para qualquer coisa de mais perfeito (um «Ómega»). Deus e o mundo não são mais pensados como duas esferas separadas: existe correlação (o profano é entendido como uma parábola do divino).

Estádio 5: «intersubjectividade» absoluta
Neste ponto, o Último é considerado como «liberdade absoluta» que quer ter necessidade dos homens. Manifesta-se sobretudo na inter-subjectividade e na não contingência. Agora o homem não tem mais necessidade do «plano»: ele procura a solidariedade universal numa liberdade absoluta no confronto com o outro. Ele não é apenas livre frente ao Último (estádio 3) e graças ao Último (enquanto condição do agir humano: estádio 4), mas é «livre para» o Último. Uma dinâmica interactiva (o homem age livremente para Deus e Deus para o homem) orienta agora a vida na qual o Último está presente. E se o homem participa de maneira responsável e activa numa comunidade, faz uma experiência transcendente. As normas e a lei interna (plano) são superadas e integradas na dinâmica desta interacção.
Adivinhem quem escreveu… isso mesmo foi o Zé

Uma conversão pastoral

Depois de ler Emilio Alberich, faço eco de uma sugestão: a conversão pastoral.
Diz ele que hoje sente-se a urgência de uma mudança radical em vista de uma nova orientação pastoral na acção dos fiéis cristãos. Estamos diante de uma praxis pastoral tradicional, centralizada preferencialmente sobre a sacramentalização e na prática religiosa, que não tem futuro, que não é capaz de assumir uma autêntica opção evangelizadora, nem de responder aos desafios da nova cultura.
A tão proclamada nova evangelização projecta todo o trabalho pastoral numa perspectiva missionária, para a qual não estamos preparados.
Bem lá no fundo do problema encontra-se a necessidade de um diálogo sincero entre fé e cultura, na atitude de sincera e simpática compreensão para com o mundo de hoje, sem, por outra parte, renunciar ao necessário dever do discernimento evangélico. Sobretudo, requer-se o abandono, sem saudosismos, de toda a visão eclesiocêntrica e de todo desejo de reconquista de posições perdidas. Nesta perspectiva, devem ser superadas as frequentes tentações de cair na rigidez fundamentalista ou no fechamento elitista ou sectário.

… e não é que Alberich tem razão!

Oração

Chamaste-me, Senhor,
para que eu continue a tua obra de anúncio do Reino
que Jesus, teu Filho e nosso irmão, inaugurou em nós.
Com os profetas quero gritar-Te:
Olha, Senhor, que sou apenas uma criança
que não sabe falar.
No entanto, estou aqui para cumprir a tua vontade
e anunciar a todos que és o Deus do amor.

Senhor, conheces muito bem toda a minha vida
as minhas dúvidas, as minhas fragilidades
e os meus passos vacilantes.
Por mim, Senhor, nada posso.
Só quero que a minha vida esteja à tua disposição
como esteve a de Maria, a crente simples, a boa Mãe.

Senhor,
que eu saiba proclamar a tua mensagem
no meu grupo,
na comunidade cristã onde vivo,
para que a boa nova chegue a todos
e haja um só rebanho
e Tu sejas o nosso único Pastor.
Amen.

Álvaro Ginel

Mudam-se os tempos…

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o Mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões

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  • Estará a catequese de hoje, nomeadamente nos seus actores da ribalta, à altura de perceber a mudança que se deu no modo de mudar?
  • Quais os caminhos a trilhar para se realizar uma catequese fiel ao Mestre e ao discípulo?

Senhor!

Concede-nos, Senhor,
que falemos todas as línguas
do mundo contemporâneo:
da cultura e da civilização,
da renovação social, económica e política,
da informação
e dos meios de comunicação social.
Concede-nos que anunciemos
as tuas grandes obras
por toda a parte e em todas as coisas.
Que venha o Teu Espírito!
Que renove a face da terra
pela «revelação dos filhos de Deus».

João Paulo II

O Catequista

A década de 90 viu nascer dois instrumentos valiosos no âmbito catequético: o Catecismo da Igreja Católica(1992) e o Directório Geral da Catequese(1997). Nestes, podemos encontrar o resultado de toda a riqueza que o Concílio Ecuménico Vaticano II fez emergir na Igreja.
Mesmo a forma como o Catecismo foi acolhido mostra como, na Igreja, há tensões que nada ajudam à transmissão da fé. Há até a veleidade de, pela forma como se olha o Catecismo, pretender catalogar a que grupo de cristãos se pertence. É pena! Ou não somos todos de Cristo?!?
O Directório, por sua vez, ao consagrar uma catequese de estilo catecumenal, e ao pôr no devido destaque a Iniciação Cristã, coloca a descoberto um grande problema: faltam comunidades capazes de acolher, acompanhar e iniciar na fé.
Mas eu vejo o futuro com esperança. Sei onde pode estar a solução: nos catequistas, expressão da preocupação missionária de uma comunidade que, podendo não o ser, se quer capaz de iniciar na fé aqueles que mostram interesse em fazer um caminho de incorporação no Corpo Místico de Cristo.
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O Catequista é «chamado a ensinar Cristo deve, portanto, antes de mais nada, procurar esse lucro sobreeminente que é o conhecimento de Jesus Cristo. Tem de aceitar perder tudo (…) para ganhar a Cristo e encontrar-se nEle e conhecê-Lo, a Ele, na força da sua ressurreição e na comunhão com os sofrimentos, conformar-se com Ele na morte, na esperança de chegar a ressuscitar dos mortos»(CCE 428).
É deste despojamento que há-de surgir a Catequese.

Algumas sombras

No nosso ambiente da catequese podemos encontrar, juntamente com muitos sucessos e experiências gratificantes, um certo mal-estar que se evidencia nos seguintes fenómenos:
– A catequese, que devia ser de iniciação cristã, não inicia. A conclusão da celebração dos sacramentos de iniciação cristã é vista, por muitos adolescentes e jovens, como o fim da vida cristã. O processo de iniciação converteu-se em «conclusão» da vida cristã!;
– A catequese, apesar de se realizar também com jovens e adultos (e há várias experiências dessas) ainda é vista como uma coisa de crianças, infantil e infantilizante;
– A catequese também é vista como escola, com a mera preocupação da transmissão de conteúdos cognitivos, ignorando a totalidade da pessoa. A catequese não «toca» os corações, não é significativa.
– A catequese, que deve de ser missionária, vive quase exclusivamente daqueles que se «inscrevem», é incapaz de se propor em âmbitos a-cristãos.