Conflitos da fé, arte e ciência
Uma das marcas mais «traumáticas» da relação entre a fé cristã e a cultura, ao longo dos últimos três ou quatro séculos é, sem dúvida, o conflito entre fé, ciência e arte. O momento cultural actual, após a superação de posições extremas, quer da ciência, quer da arte, quer da própria Igreja, parece propício à recuperação do diálogo entre essas actividades humanas fundamentais.
A ciência, após o abandono das suas pretensões totalizantes e absolutas, encontra-se cada vez mais aberta à sua integração numa perspectiva mais abrangente da realidade, sem perder a sua legítima autonomia de funcionamento. A arte, após um percurso sinuoso pela destruição e metamorfose de toda a herança cultural, está cada vez mais consciente da sua relação com essa tradição, assim como com a dimensão religiosa do ser humano, percorrendo cada vez mais caminhos explícitos de transcendência. Por seu turno, a Igreja assumiu claramente o facto de que a fé cristã não precisa de entrar em conflito directo com essas actividades, naquilo em que a respectiva autonomia o justifica. O respeito por essa autonomia não contradiz a atitude crente, pois trata-se de dimensões diferentes da actividade humana.
Por outro lado, cada vez mais a fé cristã se torna consciente de que não pode ausentar-se da relação quotidiana com essas – e outras – actividades, uma vez que elas fazem parte da vida dos seres humanos e esta não pode separar-se da dimensão religiosa ou da atitude crente. Um dos grandes desafios da cultura actual à transmissão da fé consiste, precisamente, na necessidade de relacionar de modo fértil a vivência da fé com essas realizações culturais que são, sem dúvida, das mais profundas que uma cultura pode conhecer, a ponto de serem, muitas vezes, identificadas com a própria cultura. A transmissão da fé terá que, por um lado, aprender com o contributo de todos os humanos que se dedicam a essas actividades e, por outro lado, deverá orientá-las para a sua verdadeira finalidade, colocando-as ao serviço da humanização de todos os seres humanos e, desse modo, ao serviço da construção do Reino de Deus.