Análise das Interacções

Bento Duarte da Silva, Maria da Conceição Alves Ferreira, Interacção(ões) online e categorias de análise sobre interacções: um diálogo em construção, in Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Uivesidade do Minho, 2009, pp. 5780-5794.
[https://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/9968, acedido em 22-02-2010]

Este papper parte do princípio que «o digital “casou” o audiovisual, a informática e as telecomunicações, sendo que a importância desse casamento fica bem expressa pelo sociólogo Manuel Castells quando afirma que inclusive mudará a nossa cultura: “… a integração de todos os meios de comunicação e interactividade potencial, está a mudar e mudará para sempre a nossa cultura”»(Silva, Ferreira, 2009, p.5780).
Os autores referem que no seu intento de elaborar as categorias de análise das interacções online, «as metodologias na área da aprendizagem online estão a ser construídas sob tradições de pesquisa como a antropologia, sociologia, linguística e ciência da comunicação, na busca do entendimento das linguagens e das significações culturais, entendendo-se que a aprendizagem ocorre a nível individual e social» (Ibidem, pp. 5790-5791). Exemplo disso é o facto de os autores abordados – Primo, Gunawardena, Ferreira&Santos e Mehlecke – procurarem a sua fundamentação em autores como Habermas, Backtin, Austin e Searl. Estes autores «pesquisaram sobre comunicação e linguagem humana e sistematizaram as suas ideias e categorias de análise a partir dos atos de fala presencial» (Ibidem, p. 5790).
Diante da constatação de que há uma pluralidade de teóricos e teorias, com o recursos a categorias não tão harmonizáveis como seria desejável, os autores deste estudo partem da seguinte pergunta: «Quais são as teorias e categorias de análise que estão sendo utilizadas para refletir e analisar as comunicações interativas entre os sujeitos via ambiente de aprendizagem online?» (Ibidem, p. 5781).
Depois de explanar as categorias da comunicação presencial, nomeadamente na sala de aula, de Flandres (1977), Bellack (1966), Habermas (1996), debruçam-se sobre autores que estudaram as interacções mediadas por computador (CMC), e as categorias de análise por eles apresentadas.

Alex Primo (2007)
Este autor parte do princípio de que tudo é interacção, «desde o clicar com o computador às interacções humanas» (Ibidem, p. 5784).
As categorias por ele apresentadas distinguem duas posições de interacção (cf. Ibidem, p. 5785):
1 – interacção mútua (interacção bidireccional) – caracteriza-se por interacções interdependentes e processos de negociação, em que cada um participa na construção inventiva e cooperada do relacionamento, afectando-se mutuamente, pelo que os intervenientes modificam-se de forma recíproca.
2 – interacção reactiva (feedbacks) – é limitada por relações determinísticas de estímulo e resposta.

Gunawardena (1997)
Tendo presente a avaliação da construção do conhecimento mediante negociação social, esta forma de categorizar descreve a forma como o processo de conhecimento partilhado ocorre em ambientes virtuais de aprendizagem construtivista, propondo um modelo de análise dessas interacções em cinco fases (cf. Ibidem, p5785-5786):
Fase 1 – Compartilhamento e comparação de informações: fase inicial, de apresentação de opiniões sobre o assunto em questão, definição e descrição ou identificação do problema;
Fase 2 – Descoberta e exploração de discordâncias: fase exploração de pontos convergentes e divergentes de ideias entre os participantes;
Fase 3 – Negociação de significado e co-construção do conhecimento: fase de negociação de significados, propostas de co-construções para integração e consenso;
Fase 4 – Teste e modificação de sínteses propostas/co-construção: fase de apresentação de sínteses, comparação de novas ideias, com posicionamentos individuais e a outras referências;
Fase 5 – Entendimentos/aplicação de novas co-construções: fase de apresentação de sínteses de construções do grupo, sendo uma espécie de versão final dessas construções.
Este modelo tem a inovação de não centrar no professor a missão de propor as interacções e coloca no centro da análise a comunidade dos participantes aprendentes.

Ferreira&Santos (2008)
Este modelo tem presente que «o entendimento mútuo entre pessoas, [é] fundamental para a construção de conhecimento que emerge da interacção em ambientes colaborativos na Web, implica que a comunicação seja compreensiva, confiável e apropriada a um contexto social» (Ibidem, p. 5786).
O modelo proposto busca a análise de processos interactivos da aprendizagem colaborativa em função da inovação, criatividade e produção de conhecimento (cf Ibidem, p. 5787).
Os autores consideram ser este modelo apropriado para aplicar a ferramentas de produção de texto assíncronas (cf. Ibidem, p. 5788).
O modelo propõe 23 categorias de análise do processo de criação do conhecimento a nível individual e 14 categorias do processo de criação de conhecimento a nível grupal (cf. Ibidem, p.5787-5788).

Nível individual
1. Erificação e veracidade: constatação de que dado fato é verdadeiro ou falso;
2. Decisão: decisão acerca de qual fato X ou Y é verdadeira;
3. Formação de conceitos: abstracções a partir de feições, estados e correlações de entidades;
4. Especificação de feição: definição das propriedades de uma entidade;
5. Quantificação: estabelecimento ou estimativa de percentagem e quantidade geral;
6. Definição: gerar o significado de um conceito;
7. Comparação: metáforas, analogias e comparações diversas de acordo com determinados critérios;
8. Interpretação: conceito ou afirmação inferida de um padrão de dados estático ou dinâmico, chegando-se a conclusões primárias ou finais;
9. Dedução: antecedente ou consequente lógico. Identificação de instâncias de regras;
10. Instrumentalização: montagem de plano, objecto ou procedimento que permite que objectivos sejam alcançados;
11. Checagem da Informação: avaliação de fontes e qualidade da informação;
12. Avaliação da consistência: exame de pensamento na busca por contradições;
13. Redireccionamento: reorientação, transformação e redefinição conceitual;
14. Especulação
15. Análise da relevância: identificação de elementos, propriedades e relações relevantes de acordo com critérios de relevância;
16. Consideração de diferentes pontos de vista;
17. Produção fluente: produção de ideias múltiplas, alternativa e soluções;
18. Produção original: extrapolação;
19. Elaboração: aprofundamento do conhecimento;
20. Integração: combinação e integralização de ideias. Síntese;
21. Organização convergente: constatação de pertinência a uma classe. Associações. Caminho delineado e seguido;
22. Organização divergente: constatação de exclusão a uma classe. Vários caminhos delineados;
23. Indução: procura de padrões ou regularidades.

Nível grupal:
1. Explicação: fundamentar uma opinião;
2. Defesa: defender afirmação anterior com evidência ou interpretação posterior;
3. Ataque: avaliar hipótese ou opinião alheia;
4. Desafio: desafiar outros para engajarem-se na discussão grupal;
5. Inconsistência: inconsistência de ideias, conceitos ou afirmações;
6. Discordância: identificando áreas de desentendimento na busca de uma plano de acções;
7. Questões: perguntando e respondendo no sentido de avaliar a extensão do desentendimento;
8. Avanço: mudança de posição dos participantes e avanço dos argumentos e considerações;
9. Co-construção do conhecimento: integração do conhecimento. Síntese conjunta. Obtenção de um conhecimento grupal;
10. Reflexão conjunta: acomodação de metáforas e analogias;
11. Teste: teste e modificação da co-construção obtida em confronto com informações, dados colectados ou experiências pessoais;
12. Aplicação: aplicação do novo conhecimento;
13. Metacognição: reflexão acerca do processo de produção do conhecimento;
14. Intersubjectividade: intersubjectividade da solução, garantindo que todos integrantes partilhem da solução.

Mehlecke (2006)

Este modelo foi criado para a identificação das estratégias de interacção utilizadas pelos professores para a comunicação online com os alunos(cf. Ibidem, p. 5789) e apresenta as seguintes categorias:

Critério Actitudinal
1. Crítico/reflexivo: intervenções críticas, promove reflexões e promove questionamentos;
2. Explicativo: explica, orienta, responde a questionamentos;
3. Fáctico/Incentivo: faz-se presente no ambiente, incentiva a participação.

Estratégias Interaccional
1. Enunciativa Directiva: informações gerais sobre a temática em estudo;
2. Responsiva e de carácter restricto; pergunta/resposta: em resposta às questões feitas pelos alunos; monólogo;
3. Dialógica: quando acontece troca de ideias, discussões, reflexões entre professores e alunos.

Considerações finais
Diante da literatura disponível, os autores deste estudo apercebem-se da multiplicidade de perspectivas (cf. Ibidem, p. 5790), com diferentes focagens:
umas focadas nas interacções face a face, presencial, e outras nas interacções online;
umas focadas nas interacções entre professor e aluno, centradas na atitude comportamental e estratégias do professor, enquanto outras valorizam, de igual modo, os dois atores do processo de ensino/aprendizagem;
umas centradas numa perspectiva sistémico-relacional, efectuando uma abordagem mais sociológica do processo comunicacional interactivo, outras mais centradas no processo de construção de conhecimento.

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