Como católico, como percebo e vivo a Tolerância?!?

“Globalização, último desafio de harmonia”

1. O conceito de harmonia é estruturante da cultura, concebida esta como quadro inspirador de sentido para o exercício da liberdade, para a busca da realização pessoal e da felicidade, para o progresso da civilização. A busca da harmonia é ideal para a cultura clássica, é desafio e mistério na compreensão bíblica do homem e da história, é anseio de poetas e de místicos, é chave da beleza para os artistas, é conceito nuclear nas filosofias, é objectivo para todos os intervenientes na explicação e transformação do homem, do universo e da história, é expressão decisiva da Sabedoria. Curiosamente o sentido primeiro de “economia” é a busca da harmonia, realizando a unificação criativa de todos os elementos que entram no conceito de plenitude humana. Nesse sentido, antes de ser um conceito técnico-científico aplicado a uma determinada área da actividade humana, a “economia” é uma categoria teológica, que significa a busca da plena realização humana. Assim se fala de “economia da salvação”.
A busca da harmonia é árdua e complexa, coincide no existencial histórico com a realização da liberdade, é caminho a percorrer, individualmente e em comunidade, pois ninguém atinge a harmonia sozinho, sem a inter-acção da comunidade a que pertence. Todas as sabedorias religiosas e, de modo particular, a mensagem cristã, admitem que a completa harmonia não se atinge na existência temporal-histórica e que a definitiva harmonia, pessoal e comunitária, é meta-histórica, numa humanidade transformada, “novos céus e nova terra”. A tensão da eternidade é, em última análise, a tensão da harmonia definitiva.

2. O carácter complexo da busca da harmonia sente-se, desde logo, na busca da felicidade pessoal. Reconduzir à harmonia, que permite a felicidade, a complexa realidade do ser humano, ser corpóreo, irremediavelmente ligado ao universo, e ser espiritual livre, capaz de pensamento e de emoções, de realizações criativas e de contemplação estética da beleza, protagonista do seu próprio projecto de vida, mas inevitavelmente dependente de outrem para a sua realização, capaz de amor e de conflito, é obra de arte criadora, é a criação continuada que, para nós, os crentes, supõe a intervenção solícita do amor criativo de Deus.
Uma das exigências desta busca da harmonia é a inevitável dimensão social e comunitária do ser humano, o facto de ninguém chegar à harmonia se não se empenha na busca da harmonia da comunidade a que pertence. Aí ressaltam como desafios as diferenças, a harmonizar com o que todos têm em comum. A harmonia pessoal de cada um depende da harmonia da família a que pertence, da comunidade em que se insere, da sociedade em que se enquadra. A busca da harmonia da família e da comunidade, em que a Igreja tanto insiste, são apenas momentos ou etapas da busca da harmonia global da sociedade, que se deseja pacífica, fraterna, espaço de convivência, de respeito e de partilha. A construção desta sociedade harmónica constitui a essência do progresso, baliza a civilização, é a “utopia” da democracia, em que todos, iguais em dignidade e direitos, são responsáveis por todos. A organização da sociedade democrática deveria reflectir sempre um estádio avançado da busca da sua harmonia. É neste sentido que a globalização é um desafio novo à construção da harmonia, numa “economia” da humanidade como um todo.

Uma única família humana

3. O fenómeno da mobilidade humana, congénito à humanidade desde o seu início, mas que atinge, nos nossos dias, dimensões gigantescas, a facilidade dos transportes, a mediatização da vida humana, dão ao homem contemporâneo uma autêntica consciência de humanidade, de pertença a uma única “família humana”, no dizer do Papa João Paulo II. Este fenómeno acentuou a consciência das diferenças, étnicas, culturais, religiosas, de concepções e estádios de desenvolvimento, de modelos de sociedade. Mas deve proporcionar idêntica consciência do que é comum e inalienável, o “universal humano”, património de dignidade e de igualdade de direitos ao desenvolvimento harmónico. E ainda é mais ténue a consciência da responsabilidade de todos por todos e da pertença a todos da “casa comum”, que é o universo em que habitamos, nas suas riquezas e potencialidades, património comum de toda a humanidade. A afirmação do “destino universal dos bens”, corajosamente lançada por João Paulo II, relativiza os direitos das sociedades e dos Estados, porque lhes aumenta a responsabilidade na busca do “bem-comum” universal.
Esta consciência de unidade de uma só “família humana”, acentua o conhecimento da diversidade e da diferença, que devem ser valorizadas e não ignoradas, na busca da harmonia global. Torna-se claro que nenhum país ou região do globo se podem desenvolver sozinhas. O progresso em ordem à harmonia ou será global ou não será. Quando Paulo VI proclamou em Bombaim que o progresso é o novo nome da paz, afirmou essa interdependência universal. A defesa de interesses particulares por países e povos é, hoje, um dos obstáculos a ultrapassar na busca da harmonia global. Isso traz às diversas políticas das nações exigências tão novas, que alteram essencialmente a própria essência da política. De certo modo, cada governante ou decisor, age sempre em nome da humanidade.
Este dinamismo global é já notório nos principais sectores do “bem-comum” universal. A política concebida como condução do destino dos povos tem já consciência desta responsabilidade universal, embora não seja ainda suficientemente eficaz, a ponto de levar a renúncias particularistas e a opções generosas, em nome do “bem-comum” universal. Vejam-se as dificuldades nas políticas do ambiente e de defesa do planeta, inevitavelmente universais e na própria partilha das aquisições da ciência, tantas vezes condicionadas a interesses materiais. Tudo isto sublinha a importância dos organismos internacionais e da sua capacidade real de intervenção, na busca de uma desejada autoridade mundial.
Nas políticas económicas e na própria ciência económica as consequências desta globalização da “família humana”, são sérias e inevitáveis. Compete à economia gizar os modelos e os mecanismos do desenvolvimento que hoje têm de integrar, inevitavelmente, os dados reais da humanidade. As dificuldades e potencialidades sentidas no desenvolvimento de cada região do mundo, incluído esse drama gigantesco da pobreza, tornaram-se dados incontornáveis das economias dos países ricos e desenvolvidos. Os passos significativos que já se deram da harmonização do comércio em plano mundial são disso uma concretização. Mais hesitantes são ainda as políticas de emigração, pela complexidade de que se revestem e pelos novos equilíbrios que sugerem. A emigração é, hoje, um grito angustiado de alerta para a necessidade de novos cenários de corresponsabilidade global nos processos de desenvolvimento.

O regresso da cultura como factor decisivo

4. A busca desta harmonia universal torna-se impossível se não se considerar de novo a importância decisiva do factor cultural. Nada acontecerá de maneira sólida e duradoira se não se tiver em conta o contexto cultural do desenvolvimento. Isto convida-nos a reflectir sobre os modelos de desenvolvimento que tenham em conta o factor cultural e em que a dimensão económica não pode ser a única. Um desenvolvimento sustentado para os diversos povos tem de alicerçar-se na visão cultural do homem e da sociedade e, a nível global, passa necessariamente pelo diálogo inter-cultural que inclui o diálogo inter-religioso.
A cultura é o quadro onde se constrói a harmonia, pois só nela se bebe o sentido do homem e da história. Da importância dada ao factor cultural emerge a importância da dimensão ética do desenvolvimento. Também no processo do desenvolvimento das sociedades os fins não justificam os meios. Nem tudo é legítimo, mesmo que seja eficaz, se tivermos em conta a dignidade da pessoa humana e o modelo de felicidade que a realiza. A imensa pluralidade de culturas e de religiões convida-nos a definir o tal “universal humano”, base inspiradora de uma ética universal. A economia, no âmago da própria epistemologia, tem de valorizar a dimensão cultural e reconsiderar a, por vezes apregoada, neutralidade ética. Só a exigência da perspectiva ética a levará a propor modelos sempre renovados de desenvolvimento.
A globalização não é só uma ameaça. Ela apresenta-nos um desafio apaixonante de busca da harmonia, não apenas de cada povo, mas de toda a família humana. É um longo caminho a percorrer, que precisa de “profetas” que rasguem clareiras de esperança, e levem as sociedades a não ficarem prisioneiras do pragmatismo das soluções imediatas. Este horizonte alargado da esperança é essencial para um futuro novo da humanidade.
† JOSÉ, Cardeal-Patriarca


[Artigo publicado na Ravista ECONOMIA, em Dezembro de 2005. Foi-me partilhado por um colega. Obrigado!]

O Quê?!?!


Esta imagem fez-me pensar, por analogia, naquilo que acontece nas catequese. Ou não será? 😉

HOME E viu Deus que era muito bom… (Cf Gn 1, 31)

Depois de um amigo ter partilhado comigo este filme, não posso deixar de o mostrar, deixando ecoar em mim os textos do Génesis quando nos falam da Criação e do consequente compromisso ecológico de cada cristão.

Home é um filme da autoria do realizador francês Yann Arthus-Bertrand, é constituído por paisagens aéreas do mundo inteiro e pretende sensibilizar a opinião pública mundial sobre a necessidade de alterar modos e hábitos de vida a fim de evitar uma catástrofe ecológica planetária.

O filme na íntegra (1:58’18’’), dobrado em português e com qualidade HD pode ser visto aqui.

Igreja é Comunhão – III

A Comunhão na Sagrada Escritura

Para já, podemos adiantar que comunhão humana deriva da comunhão trinitária, como a imagem deriva do original, causa exemplar e inclui a distinção, a diferença e a pluralidade. Só se torna possível porque o Pai toma inteiramente a iniciativa, enviando o seu Filho como vida para o mundo.
A novidade da condição do cristão consiste fundamentalmente na sua participação na vida trinitária, que a teologia bíblica neotestamentária designa com o termo grego koinônia. A salvação obtêm-se através da comunhão com Cristo e com os outros baptizados. E a mística da unidade “entre Deus e o homem, e entre os homens e Cristo, é no cristianismo uma mística do encontro […]. Assim se constata também neste aspecto que o mistério trinitário é o fundamento mais profundo e o sentido último do mistério da pessoa humana e da sua perfeição no amor”(Walter Kasper).
A comunhão tem subjacente a dinâmica do amor divino, de um Deus que se revela aos homens e se dá a conhecer por amor.
A Sagrada Escritura é fonte de comunhão e cânone por onde se pode verificar a autenticidade das várias comunhões; é o garante inspirador de ulteriores comunhões, pois o homem por si só não era capaz de comunhão; a comunhão horizontal é fruto e reflexo da comunhão vertical.

“Esta união e comunhão dos homens entre si encontra na trindade o seu exemplo e fonte. Na verdade, Deus quis introduzir os homens no mistério do amor da comunhão trinitária. Quis que os homens dispersos, divididos, filhos da cólera e da iniquidade, se congregassem e reunissem no Espírito de amor, a exemplo das Pessoas divinas. Por meio da Igreja, Deus quis fazer de todos os homens uma só família, um só povo, um só corpo de Cristo. E quis que o elemento de união, de coesão desse povo fosse o amor pelo qual o Pai ama o Filho e Filho ama o Pai”(René Latourelle).

O amor, como fonte de coesão, é um reflexo do amor trino revelado pelos textos do Novo Testamento, no qual viver em Igreja “como comunidade não significa configurá-la ao arbítrio de grupos ou maiorias. A comunidade eclesial é comunidade com Deus por Jesus Cristo e no Espírito Santo e desenvolve-se como comunidade na Palavra de Deus e nos sacramentos”(J. Pottmeyer). Como consequência, a palavra comunhão (koinônia) significa participação comum. Designa uma relação baseada na participação e uma realidade partilhada. Exprime a participação comum em Jesus Cristo, no Seu Evangelho, na Sua fé, transmitidos pelos Doze. Aqui o Espírito Santo manifesta a sua acção como autêntico agente dessa comunhão que converte em católica a Igreja universal, ao integrar a diversidade e pluralidade de elementos, como tema essencial.
A comunhão é a participação na realidade da salvação na qual Deus nos introduz pelo baptismo e é também uma exigência, feita por Deus de actuação intramundana.
Perante estes dados, “a Comunhão trinitária é fonte de inspiração para práticas sociais. Especialmente os cristãos comprometidos com mudanças estruturais da sociedade a partir das grandes maiorias pobres encontram na Tri-unidade a sua utopia eterna.[…] Por isso uma sociedade que se deixa inspirar pela comunhão trinitária não pode tolerar as classes, as dominações a partir de um poder (económico, sexual ou ideológico) que submete e marginaliza os demais diferentes”(Leonardo Boff). As comunidades primitivas, fiéis à sua missão, anunciam o Deus criador que quer a plena realização da criatura humana, e esta só se pode realizar na sociedade do amor, não pode deixar de haver relação entre a história eterna da comunhão trinitária e o processo histórico de construção da família humana. Esta comunhão fraterna tem como base a fé, em referência à doutrina dos Apóstolos: expressa-se no culto, mediante a fracção do pão e as orações e toma a sua realização concreta através da partilha dos bens materiais”(Bruno Forte).
A comunhão em Cristo é activa, é dinâmica, operacional, não se ficando apenas na contemplação, mas concretiza-se em obras. A comunhão em Cristo é fonte de comunhão com todas as pessoas.
A Igreja, a partir da comunhão pericorética da Trindade, “mistério solar, ilumina o mistério lunar da Igreja, mostra-se como um mistério derivado (mysterium derivatum como falavam os Padres da Igreja) de outros mistérios mais fundamentais, principalmente, daquele do amor e da comunhão entre os divinos Três. Como há a koinónia trinitária, assim há a koinónia eclesial”(Leonardo Boff).
É precisamente desta realidade, a eclesial, de que nos vamos ocupar no próximo post.

A Igreja é Comunhão II

Nova Visão de Igreja
Torna-se necessária uma nova visão da Igreja e da sua missão, pois “durante muito séculos a certeza foi garantida pelo conceito de Deus. Deus omnisciente, omnipresente e omnipotente, não só criara o mundo como também promulgara os princípios de acção a respeito dos quais não havia dúvidas. A Igreja ‘interpretava’ detalhadamente esses princípios, e o indivíduo, que garantia seu lugar na Igreja atendo-se às suas regras, estava certo de que, independentemente do que acontecesse, ele estava no caminho da salvação e da vida eterna no céu”(Erich Fromm). Hoje em toda a sociedade, e não só na Igreja institucional, “a própria identidade social está em questão. Pois cada indivíduo não se pode mais apoiar sobre um fundamento social comummente admitido por todos, a questão que se põe é sobre que fundamentar a existência. Há alguma coisa que precede o indivíduo? E se nada o precede, como é que o sujeito se pode tornar ele mesmo?”(Yves Petiton). A liberdade está subjacente a esta mudança, sendo aquela um dos valores que o homem dos nossos dias defende com todo o afinco. Mas enquanto que para a Igreja, a comunidade precede o indivíduo e cada um não se pode determinar a não ser em referência ao que o precede. Isto explica, em parte, a crise eclesial sem precedentes que vivemos. Em consequência, devemos compreender esta crise como a elaboração de novos modelos. Depois poderemos verificar se a comunhão, como tal, está em crise ou é a forma de a realizar que não responde às questões do nosso tempo.
Os cristãos admitem que a “communio não se realiza ‘a partir de baixo’; ela é graça e dom, participação comum na única verdade, na única vida e no único amor de que Deus nos fez participantes por meio de Jesus Cristo, através da mediação da Palavra e do sacramento, no Espírito Santo”(Walter Kasper).

A Igreja é Comunhão I

A inovação do Vaticano II de maior transcendência para a eclesiologia e para a vida da Igreja foi o ter centrado a teologia do mistério da Igreja sobre a noção de comunhão (A. Antón).

No mais íntimo do homem, a comunhão aparece como algo de desejável; é um valor digno de ser querido. Mas é uma realidade que todos “nascemos sós, vivemos sós e morremos sós. E que, até nas horas menos infelizes, no mais fundo do nosso inconsciente, lateja, cruciante, a dor incurável dessa condenação”( Miguel Torga). A solidão transforma-se numa fobia, em algo que impede o normal exercício da vida.

Contudo, “sabemos também que a Bíblia, o livro dos livros, nos ensina que não há homem sem homem, e que o próprio Cristo teve, a caminho do Calvário, a fortuna dum Cireneu para o aliviar do peso da cruz. O que, trocado por miúdos, significa que a solidão radical de cada existência — que, nos poetas, a cegueira de Homero ilustra premonitora e paradigmaticamente —, é mitigada por uma força que, se não vence o destino, inconformadamente desde sempre o desafia […]. A graça desta comunhão humana, sem a qual a passagem pelo mundo não teria sentido. Para mim, pelo menos, feito dum barro tão frágil e vulnerável, que necessito de ser amado durante a vida e de acalentar a esperança de continuar a sê-lo depois da morte” (Idem).

Miguel Torga sintetiza deste modo peculiar o desejo e aspiração humanos à comunhão, aquela ânsia de ser membro.
Mas o sentimento de comunhão está em crise, quer socialmente, num sentido mais amplo, quer eclesialmente, num sentido mais restrito. Pois a crise de pertença eclesial e a recomposição caleidoscópica do religioso que ela arrasta inscrevem-se na evolução geral das nossas sociedades industrializadas e urbanas, caracterizadas pela mobilidade, particularmente pelas mudanças determinadas pelas orientações sócio-económicas, assim como pela atenuação do controle social e a valorização da capacidade de escolha pessoal.
Nos nossos dias há muitos indícios que revelam o mal-estar que entrou nos sectores dirigentes, nas comunidades religiosas e no clero. Há países em que algumas comunidades religiosas e mesmo o clero fazem o inventário dos seus efectivos e tomam consciência de constituir os “últimos exemplares de uma espécie em perigo de extinção”(Martin Velasco). Perspectivando o futuro, agrava-se o mal-estar de muitos cristãos que se interrogam sobre se o cristianismo, “semelhante a essas gloriosas ruínas de onde se tiram materiais para outras construções, se vai convertendo em algo que proporciona às nossas sociedades um vocabulário, um tesouro de símbolos, de sinais e de práticas que se empregam noutras partes, da forma que convém a cada um e cada grupo”(Ibidem).

Desenvolvimento Científico
O desenvolvimento científico – a meu ver, quando mal usado – é também ele um grande motor deste desajuste social, gerador de mal-estar. E se até há uns anos atrás bastava conciliar a fé com a ciência para trazer a paz às consciências, hoje já não é assim; “interessa confrontar o Deus vivo, experimentado por qualquer comunidade cristã autêntica, com uma ciência que também é vida das sociedades, e tende a constituir-se em mito”(Luís Archer). A sociedade dos nossos dias está a investir muita da sua esperança nas elaboração das novas tecnologias e a Igreja tem também algo a dizer, acima de tudo tem que se dizer a ela mesma neste contexto e transmitir a sua Mensagem, e isto nem sempre se realiza, pelo menos de uma forma frutífera. A prová-lo está “o facto de que o número dos que não comungam com ela [Igreja] seja hoje maior do que os que comungam, é a miséria da Igreja, a ferida profunda do corpo do Senhor que a deve sentir como sua própria ferida”(Josef Ratzinger).
É um dado assente que, pela primeira vez na história, “os discursos pelos quais uma civilização se pensa não são religiosos. Mas a experiência que se designa também ela como ‘religiosa’ não persiste mais, pulveriza-se somente. Multiplica-se e dispersa-se. Afasta-se das grandes instituições unificadas que eram até aqui as religiões. Ela afasta-se cada vez mais das ‘pertenças’ eclesiais. Se ela ainda se diz, é através de múltiplos discursos em formação, porque nenhuma instituição está em situação ‘sacerdotal’ de dizer a todos uma verdade total”(Michael de Certeu). A reflexão sobre a pertença eclesial, o realizar a comunhão, levanta questões que são tratadas na identidade eclesial. Nas nossas sociedades seculares, a religião católica deixou de ser um fundamento social e a Igreja perdeu a sua influência sobre as pessoas.

A Igreja é Comunhão!

Hoje, a vivência da comunhão pode assumir novos contornos; as possibilidades oferecidas pela técnica podem ajudar a uma maior clarificação do conceito de “comunhão” e a descobrir novas formas de a praticar. É um dado assente que esta revolução é universal, tal como a Igreja pretende ser – católica –, assim à Igreja cabe compreender este processo, assimilá-lo, na medida do possível, para poder situar-se na nova sociedade e realizar aí a sua missão, numa sociedade que pode caminhar para o bem e para o mal.

É com este pressuposto que eu, como crente, me proponho publicitar aqui uma série de reflexões que em tempos fiz e que têm ficado guardadas – não na gaveta –, mas no disco duro.